1.
O
After
- Mais uma rodada, por favor!
Eu estava completamente
falante, essa era uma característica minha quando extrapolava na bebida. Era um
bom motivo para se comemorar depois de mais um termino de namoro, sair em um
sábado à noite como todos os outros e rodeada pelas fieis amigas. Somos cinco
amigas com perfis bem diferentes e com muitas histórias.
Uma geração de garotas
diferentes talvez. Não, não pegamos umas as outras, somos de uma geração que
não existe casamento perfeito, também não somos as certinhas feministas nem as
de baixa categoria que você encontra usando uma minúscula saia para mostrar o
tamanho do seu útero. Podemos ser tituladas como “boemias” do século XXI.
- Falei que não iriam durar cinco meses?
Ou era o outro namoro? Dizia Beca para todos na roda com um olhar, “eu já
sabia”.
- Não tenho culpa que sou a mais
apaixonada do grupo. Em outra vida eu devia ter sido a deusa do amor! Dei uma
piscada enquanto todas riam da minha filosofia barata.
- Morgana tu é difícil! Faz os homens se
apaixonarem perdidamente, todo aquele “eu te amo”, faz eles de véu e grinalda e
depois da um pé na bunda! Parece que tu procuras amores impossíveis, eu nunca
te entendo!
A festa era alvo na região, Khawala
um nome egípcio foi escolhido para o lugar. Havia uma portal na entrada com um
signo de besouro, o chão era de uma areia fina, luzes ambientes em um lugar
aberto e distante da cidade, com grande lagos e tendas, “pouco sofisticada”
pensei. Via-se pessoas de todos os lugares e muitas pessoas me perguntavam por
que eu frequentava e o que eu via de graça neles. Pessoas perguntam demais e eu
me aborrecia disso, bebi mais um gole de vodka e fui em direção ao banheiro
passando por algumas pessoas totalmente alucinadas. LSD predominam nesses
lugares, para aguentar até as 10h da manhã a “balinha” como chamam, faz milagre. É muito engraçado ver essas
pessoas alucinadas parecendo um bando de zumbis saídos do seriado The walking dead. Claro que já me
ofereceram... Um monte de vezes... Além de caro não me interesso em entrar em estado
de “Êxtase pra sempre”. Dei uma retocada no batom bordô e no delineador preto, amo
bordô, sempre foi meu favorito e me lembra algo Dark, uma física marrom, saia paetê
preta e um bolero jeans, fiquei analisando essa combinação com meu cabelo loiro
até Paula entrar no banheiro frenética:
- Te achei, vamos logo porque eu AMO
essa musica!
Depois de rir do susto que levei pensei se
ela sempre iria fazer esse tipo de coisa comigo...
- Que musica ? Olhei fazendo cara de surpresa.
- Aquela One Day, eu acho!!!!
Saímos depressa em
direção onde estava o resto do grupo, a musica tinha uma batida forte, se abraçamos
automaticamente, começamos a pular e a cantar o refrão tão alto como se todas
as cinco tivessem uma única voz. Isso sempre acontecia quando uma musica
conhecida e querida por todas tocava, onde quer que estivéssemos saiamos à
procura das outras. É uma sensação mágica que arrepia toda a espinha te faz
leve e sorridente como se estivemos sem chão, na lua sem gravidade. Quando a
musica terminou nos olhamos e rimos uma das outras, sabíamos que era o nosso
momento.
- Acho que devíamos fazer um after no litoral! Luiza passando a mão
no bolso para ligar pro resto do grupo.
- Então vamos... Vou ligar para o Tiago,
nos encontrar lá. Falei entusiasmada passando a mão na bolsa tentando procurar
o celular.
Fomos até a saída do
evento em direção ao estacionamento, enquanto combinava com Tiago e Luis o
local do after. Bianca é quem estava
dirigindo, um golf branco ano 2009, ela havia comprado havia duas
semanas.
- Tenho medo de você no volante Bianca!
Luiza disse com voz de deboche.
- Vou te deixar a pé então! Respondeu
Bianca ligando o som em alto volume para abafar nossas risadas.
Liguei meu GPS e pedi
para que ela segui-se na nova estrada que haviam inaugurado no dia anterior.
Todas animadas e totalmente embriagadas, o after
seria feito em uma praiazinha onde nosso amigo tinha uma casa e era totalmente
isolada, poderíamos fazer festa até o sol nascer. Esse era o objetivo até
entrarmos na nova estrada.
Passando pela placa de entrada a nova estrada
era escura e sinistra, não havia sinalização e postes de iluminação. Nos
olhamos por um momento... baixei o volume com ar de suspense até ouvir o
silencio no carro.
- Essa estrada é estranha, parece até
filme de terror. Caprichei na carreta de medo.
- Não exagera!! Temos um GPS e uma
motorista profissional, e um tanque cheio. Disse Bianca com humor negro.
Andamos alguns
kilometros, parecia que a estrada não tinha fim, resolvi ligar para o Tiago e
avisar que iríamos demorar alguns minutos e aproveitaria pra pedir se conheciam
outro trajeto, foi quando percebi que o sinal não pegava e o GPS estava sem
contato. Foi ai que eu me virei e mostrei para Luiza, para Paula e para Jaque
que estavam no banco de traz o que havia acontecido.
- Bianca!!! Gritamos.
- É hora de voltarmos, porque aqui não tem área
estamos no meio do mato. Disse Luiza.
- É melhor nos garantirmos na rodovia
principal! Disse Paula.
- Hm... ta bom! Suas medrosas! farei a
volta, só deixa eu achar um lugar para poder fazer isso.
Foi um alivio fazer a
cabeça da Bianca, porque das cinco ela era a mais teimosa e brava. Certa vez,
saí da faculdade mais cedo com Tiago pegamos pelo caminho o Luiz e o Daniel,
paramos em um posto e compramos um litro de vodka de lá até o estacionamento de
uma danceteria abandonada, ela e Paula nos encontraram depois. Bebemos muito e
no alvoroço de tudo aquilo os meninos tiraram as roupas e a correram por todo o
estacionamento, comecei a rir enquanto Bianca ficou zangada. Pegou as roupas dos meninos e colocou fogo,
depois daquele dia nunca mais decidimos contrariá-la, só que nesse caso ela nos
ouviu.
Logo a frente havia um
espaço onde pudéssemos fazer a voltar, estava escuro e ela não viu que tinha um
arreião perto de um precipício, senti o carro inclinando olhei para todas com a
sensação que era a ultima lembrança que haveria de ter, tudo se movia lento e
rápido ao mesmo tempo, o carro girava, eu sentia fortes batidas em todas as
direções, ouvia-as gritando e tentando desprender os cintos desesperadas mais
era tarde demais e inútil naquela hora. Fechei os olhos respirei fundo e
mergulhei no meu próprio abismo.
2. O oceano Vermelho
“Quando
o silencio paira nas mentes inquietantes, é como estar se afogando no meio de
um oceano, sua voz se cala e a única coisa que você necessita é de um respiro
na superfície.”
Uma serrinha... De fundo um barulho baixinho
como uma broca de dentista eu escutava. Mas, não via nada, não sentia nada. Eu
escutava quase como se fosse um zumbido no meu ouvido, devagar tentei abrir
meus olhos. Difuso, abrindo devagar, o
céu era de um breu que pensei que estivesse ainda com os olhos fechados, “aonde
eu estava?”, me perguntei. Deitada, vi
um céu sem estrelas sentindo um frio gelado pelo meu corpo e deduzi que estava
sem minhas roupas, engoli seco. Foi então de soslaio olhei para meu lado e vi
Paula olhando nitidamente pra mim, com seus olhos claros, agora mortos. Seu pé
estava do lado de sua cabeça, seu estomago enrolado em seu pescoço, ela estava
como um manequim em pedaços ensangüentados.
Comecei a chorar baixinho, era horrendo de ver e o cheiro era de uma
carnificina que fiquei enjoada, seja o que teria acontecido, eu não estaria sem
roupas por causa do acidente, alguém teria feito isso. Tive medo que alguem
estivesse perto, fui analisando o lugar e devagar sentei eu estava em um Cais, um
lugar totalmente isolado, pude ouvir as ondas do mar . Olhei para minhas pernas
sentindo gosto de sangue entre meus lábios e reparei que havia algo de errado,
olhei para meus braços e a ficha caiu, eu estava costurada no corpo de outras
pessoas, os pontos e os cortes eram nítidos, o pânico tomou conta de mim. “Como
alguém pode viver depois de ser cortada em pedaços e montada em um
quebra-cabeça que não é seu?” pensei.
É um sentimento de não
querer estar ai, como quando uma criança sabe que esta de castigo por ter feito
algo errado, mas no caso eu estaria ferrada por outro motivo que não sabia o
qual. Abri e fechei minha mão, enformigava cada vez que eu fechava-a, unhas e
esmaltes diferentes, dedos longos, cheiro de enxofre que inalava.
Confusão... Medo e desespero.